A análise da distribuição dos 44,7 mil tucanos aptos a votar nas prévias presidenciais do PSDB mostra que o governador de São Paulo, João Doria, mobilizou os filiados sem mandato, grupo em que tem larga vantagem. Já o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, conta com a preferência dos caciques.
O PSDB definiu, na segunda-feira (15), o colégio eleitoral das prévias, que também têm a participação do ex-prefeito Arthur Virgílio (AM). Com o fim do prazo para inscrição no aplicativo de votação, cerca de 3% do 1,3 milhão de filiados tucanos no país se cadastraram para votar.
A análise do universo de cadastrados, porém, deve ser lida com cautela. Estar inscrito no aplicativo é o primeiro passo para a votação, mas os filiados precisarão ainda votar de fato, no domingo (21), das 8h às 15h.
Em segundo lugar, as estimativas levam em conta os estados cujos diretórios declararam apoio formal a Leite ou Doria mas, dentro desses estados, há diversas dissidências.
No Rio Grande do Sul, por exemplo, Doria tem o apoio da ex-governadora Yeda Crusius, enquanto Leite tem paulistas ligados ao ex-governador Geraldo Alckmin em sua campanha.
A votação está acirrada entre Leite, que tem o apoio de mais estados e é considerado favorito entre congressistas tucanos, e Doria, que conta com a máquina do partido em São Paulo estado que concentra filiados, prefeitos e vereadores do país e onde a sigla tem maior capacidade de mobilização.
Enquanto a campanha de Doria projeta a vitória do governador paulista, os estrategistas de Leite dizem acreditar que ele levará a nomeação.
A eleição será indireta, com cada um dos quatro grupos de votantes representando 25% da pontuação.
Para quem acompanha os números do partido, a força dos militantes pode levar Doria a vencer, assim como a vantagem de Leite entre parlamentares pode lhe colocar na frente. A diferença entre eles tende a ser pequena, o que pode levar o resultado a ser questionado.
São Paulo, que tem cerca de 22% dos filiados do PSDB, mas, no universo de cadastrados, chega a 62%, comemorou a força de mobilização.
Para isso, o diretório paulista realizou mutirões de cadastramento, utilizou estrutura de call center e fez até eventos com churrasco para promover a inscrição dos filiados no aplicativo.
O Rio Grande do Sul ampliou sua participação, mas não como São Paulo. O estado representa 7% dos filiados, segundo o Tribunal Superior Eleitoral, e cadastrou 9% dos militantes.
Aliados de Leite ponderam, porém, que os estados que apoiam o gaúcho, como Minas Gerais, tiveram bom resultado no cadastramento de prefeitos, vice-prefeitos e vereadores, chegando a atingir a totalidade.
Considerando o peso de São Paulo de forma ponderada entre os grupos, o estado representa 35% dos cadastrados. Para conselheiros do governador gaúcho, Doria força uma narrativa de vitória a partir dos 62% de filiados, mas, na verdade, o jogo é imprevisível.
Diante da divulgação pela campanha de Doria de ter alcançado 62% dos cadastrados, a campanha de Leite rebateu: “A campanha de Doria ou não entendeu as regras da votação ou está propositalmente tentando confundir a militância e a imprensa”. Os gaúchos lembram que esse valor deve ser dividido por quatro.
Nesta semana, as duas campanhas também tiveram desentendimentos a respeito do aplicativo de votação. A ferramenta é considerada vulnerável e foi alvo de um ataque na segunda, o que atrasou a divulgação dos dados de cadastramento.
Um acordo para que as campanhas contratem empresas de TI para acompanhar o processo de votação trouxe mais segurança, mas os receios de judicialização do processo a partir do aplicativo persistem.
Depois de reuniões tensas e troca de críticas em debates, Doria e Leite buscaram um gesto de pacificação, na terça (16), ao se reunirem em Porto Alegre. Uma união do partido em torno do vencedor, porém, é vista com ceticismo.
No grupo de filiados sem mandato, com quase 40 mil inscritos, Doria confirmou seu favoritismo, já que 62% dos cadastrados são de São Paulo. Além de São Paulo, Doria tem o apoio declarado dos diretórios de PA, RN, DF e AC somando 66,1% dos filiados inscritos.
Já os estados que apoiam Leite (RS, PR, MG, BA, AP, AL, CE, RO e MS) somam 22,5% dos filiados sem mandato aptos a participarem das prévias. Em Santa Catarina, a maior parte da executiva declarou apoio a Leite, mas o partido não fechou questão.
Há ainda os filiados de estados que não declararam apoios formalmente outros 11%. O grupo de filiados sem mandato corresponde a um quarto da pontuação final.
No grupo considerado principal, com 52 tucanos do alto clero, que também correspondem a 25% da pontuação final, Leite deve ter pouco mais que a metade dos votos, podendo chegar a 60%.
O grupo inclui os deputados federais, senadores, governadores e vices, além dos ex-presidentes e o atual presidente do PSDB, Bruno Araújo. A composição desse grupo, com maior peso na pontuação, é alvo de embate entre Doria e Leite.
Aliados do paulista reclamam do fato de que Alckmin, ex-presidente do PSDB, se cadastrou e dará seu voto a Leite já que se tornou um desafeto de Doria.
A campanha do gaúcho questiona a inclusão do deputado federal Miguel Haddad (SP), aliado de Doria que assumiu o mandato na última quinta (11), no colégio principal.
No grupo que reúne prefeitos e vice-prefeitos, que também representa 25% da apuração final, o cenário é de equilíbrio entre os estados que apoiam Doria e aqueles que apoiam Leite aqui, as dissidências podem levar vantagem a um ou outro.
Outro embate apertado se dá no terceiro grupo. Os vereadores representam 12,5% da soma total, pois formam o grupo com os deputados estaduais que também representam 12,5%.
De maneira geral, a distribuição dos cadastrados reforçou as projeções de que Leite teria mais que a metade no alto clero e Doria venceria com larga margem entre os filiados.
Além dos filiados, auxiliares do paulista calculam sua vitória entre prefeitos, vices, deputados estaduais e vereadores. Auxiliares do gaúcho, por sua vez, estimam vencer nos três grupos de políticos e admitem a derrota entre filiados.
A divisão de filiados a favor de Doria e mandatários a favor de Leite complica a missão do PSDB de estabelecer uma união em torno do vencedor, com todo o partido empenhado na campanha de 2022.
Na reta final, Doria e Leite também subiram o tom, trocando críticas e acusações em debates, indicativo de que a sigla terminará as prévias rachada.
Como mostrou o jornal Folha de S.Paulo, há relatos de pressão entre prefeitos e filiados. O caso mais emblemático foi a demissão do secretário de Habitação do município São Paulo, Orlando Faria, após declarar voto em Leite. A reportagem mapeou outras situações semelhantes.
Além das divisões internas, as prévias evidenciaram o tamanho do PSDB no país. Desde o princípio, os caciques tucanos estimaram que a participação não chegaria perto do 1,3 milhão de filiados a grande maioria não participa da vida partidária e a sigla não tem informações para contatá-los.
Na opinião de parlamentares tucanos, as prévias são positivas por reanimarem a militância do PSDB, colocarem o partido na mídia e resgatarem seu protagonismo e legado.
No entanto, o cadastro não alcançou nem uma centena de milhar, parando em 44,7 mil. É a primeira prévia nacional do partido.
O PSDB realizou duas outras prévias, em São Paulo, em 2018 e 2016 ambas vencidas por Doria, que concorreu ao Governo de São Paulo e à prefeitura da capital, também tendo conquistado os dois cargos.
Em 2016, Doria teve 43% dos cerca de 6.100 votos no primeiro turno e venceu o segundo turno com quase a totalidade dos 3.200 votos. A capital paulista tinha cerca de 27 mil filiados à época.
Em 2018, ele teve 80% dos votos de cerca de 15 mil votos o total de filiados do estado na época era de aproximadamente 310 mil.